ROTINA



Quando os primeiros clarões do dia aparecem,
estamos de pé
e, rotineiramente,
a vida nossa recomeça
no cenário de mais um dia...!



É sempre assim...
uma rotina que não tem fim!



Usa-se o vaso,
jorra água do chuveiro quente,
escovam-se os dentes,
tira-se o sono da face,
fecha-se a porta.




Ela desce,
sem fazer barulho na escada,
enquanto eu ainda me espreguiço
no final da madrugada.



Mas de repente,
quando pouco tempo passa,
vem a fumaça.
É o primeiro cigarro,
antes de pôr água na chaleira.



Ouço a tosse,
sinto o pigarro
e o meu ar puro termina,
nessa prática constante,
de entrega à nicotina.



Chimarrão intercalado,
entre tragadas e notícias.
Depois um cafezinho,
outro souza cruz que ela incendeia,
enquanto a pia é desocupada.

Tem roupa para lavar,
tem cama para arrumar,
tem casa para limpar.
O crochê está esperando.
Cinzeiro e o banco prontos,
para o início dos trabalhos.

Eu já estou nas ruas,
envolto no trânsito louco,
brigando para ter espaço,
e chegar inteiro ao trabalho.
Nove quilômetros de paciência,
já chego quase um bagaço.

E telefones me esperam.
Estórias de funcionários,
que nunca chegam no horário,
que solicitam clemência.
Finjo que aceito as desculpas,
e o trabalho recomeça.
Alô..., pois não, sim, é o Hilário,
o seu processo chegou,
está sendo examinado.
- Ah..., mas que demora!
- Requer um tempo, senhora...
Claro que os relatores trabalham,
a assessoria analisa,
ocupa-se até fora de hora.
É uma satisfação... continue ligando...
Vou tornar seu caso urgente.
Oh que bom se eu pudesse,
falar bem diferente!
Dizer-lhes sempre o contrário!

É duro agüentar os papos,
Escutar as companheiras:
- Estou muito cansada!
- O domingo foi uma droga!
- Meu corpo todo doído!
- Ufa, esse tempo não passa...
- Briguei com minha sogra!
- Xinguei o meu marido!
- A filha anda levada!
- Comprei uma televisão!
- Fui na loja de um e noventa e nove...
- Ai, meu Deus, que enxaqueca!
- Tenho ódio dessa chuva!
- Esse calor me massacra, adoro viver no inverno!
- A praia estava linda!
- Vai ser duro, mais uma semana!
- Que nojo desse governo, consumiu nosso salário!
- O dia hoje está lindo...!

- Boa tarde, meu grande Hilário!
Levo um susto, já são treze horas.
É a pontualidade da Margarida.
Muitos ainda não chegaram
e vai tempo para isso...



Às quatorze, sorrateiros,
o rapaz da reprografia
e outro da informática.
São sempre os derradeiros,
quando o início é às treze.



Telefonemas prosseguem,
convenço muitos, outros xingam,
mas às dezoito, quase escuro,
nosso expediente termina.
Porém já tem gente em casa,
estavam com enxaqueca,
reclamavam a catarata,
molezas no corpo todo.
Pediram para sair
bem antes do fim do horário.

Estou novamente de volta...
Encontro-a trabalhando:
passa roupa, prepara marmita,
faz uns retoques na casa,
higieniza os banheiros.
Entregue ao seu desvelo,
vai as coisas ordenando,
mas o fato que me irrita,
é vê-la sempre fumando.




Resta o que nesta cidade
senão novela e a rede?
Que destino Deus me deu!
Às vinte e duas, cansado,
subo a escada, remexo a cama
após um dia inteiro,
acomodado ao travesseiro,
entrego-me a Morfeu!

Dorme, Hilário...
amanhã é novo dia!

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

ESTRANHO

OS DECRETOS DO PESSUTI

CONTRASTES