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Mostrando postagens de agosto, 2013

EFEITOS MOMENTÂNEOS

À contra gosto, mas atendendo aos pedidos que a esposa sempre fazia para que cuidasse com mais esmero daquele jardim, comprei uma cortadeira de grama moderna. Dessas que já traz consigo um saco que recolhe a grama no mesmo momento que é cortada. Uma espécie de sugador. Depois do primeiro corte: - Parabéns, trabalho exemplar, disse ela achegando-se e oferecendo-me um copo de cerveja gelado. Naquele calor e sol que rachava, uma bebida naquele estado era como o néctar dos deuses! Sentei-me sobre a grama ao seu lado e bebericando ali fiquei observando e me atribuindo elogios mentais. Que aparelho fantástico inventaram! Ela então me olhava e também querendo tecer seus elogios, indagava de mim se não estava com a razão quando insistira naquela compra.  imediatamente concordei dando-lhe os parabéns pela brilhante ideia e constante insistência. Passei longos dias e mesmo à noite acendia a luz para observar a maravilha que havia ficado o jardim da nossa casa. Que aparelho fantástic

LÁ TAMBÉM TEM

Não pensem que tudo na Europa é bonito e maravilhoso. Veja a história: Pois no final do primeiro dia do nosso passeio por Lisboa, cansados e longe do hotel onde estávamos hospedados, resolvemos pegar um ônibus para voltar. Tínhamos acabado de conhecer a Torre de Belém, passado pelo Monumento dos Descobrimentos, observado a beleza do rio Tejo, que logo abaixo deságua no Oceano Atlântico e percorrido o interior do Mosteiro dos Jerônimos. Bem à frente desse mosteiro, tomamos o ônibus para voltar. Os portugueses chamam de elétrico, mas são semelhantes aos nossos coletivos.          Estava lotado e precisamos ficar de pé. Logo que entrei percebi alguma coisa de estranho nas atitudes de uma mulher que se encostando de maneira sensual foi me levando para um canto do elétrico. Em seguida ouvi a voz do Fausto que falava alto para um homem que estava bem à minha frente, ao lado da mulher. - Tira a mão daí! O dinheiro do meu pai não! Do meu pai não! Sem entender o que acontecia, olhei

DÚVIDAS

Eu ligo as lâmpadas, ela desliga; eu abro as portas e as janelas, ela corre fechá-las; eu quero que o sol entre e ilumine tudo, ela detesta pó e diz que a poluição está grande, Não sou eu que limpo! Durante trinta dias não liguei a luz, não abri as portas, nem liberei as janelas. Por que choveu muito, quase não teve sol. Nesta minha cidade nevoenta. Num final de tarde cheguei e abri a porta. Surpresa: cheiro de bolor e ar viciado. Talão de luz por debaixo da porta acusava consumo mínimo. Agora estou numa situação difícil: Não sei se "chupo cana ou se assobio", Se acendo as luzes e pago a conta, Ou me acostumo com o cheiro  e economizo.

MULHER PERFEITA

Logo pela manhã bem cedo levanta para fazer o café. Enquanto eu gasto o tempo com a higiene, ela desce rapidamente para preparar o desjejum. Não demora dez minutos e está tudo pronto. Acomodo-me à mesa para a primeira refeição, ela já está cuidando de outras coisas. A cama vai sendo arrumada. A janela do quarto aberta traz sol e vento para dentro, eliminando o ranço da noite.          Entende que sempre tenho um dia inteiro pela frente. Começo de um dia, muitas coisas para serem feitas.  Já fora mulher a noite toda: abraços, beijos, soluços, mimos, sexo demorado. Compromissos simples, mas que somente ela sabia torná-los importantes. Não se sentia pequena pelos mais humildes, nem se engrandecia quando executava atividades sofisticadas. Ideias machistas e complicadas essas minhas! Ela não se alterava com meus olhares, nem mudava de comportamento com os elogios. - Tomou teus remédios? - Você não viu? - Esta tua roupa não está boa, precisa combinar cores! - Agora deu!

RELATÓRIO DE UMA PUTA

 Ela envelheceu. Ficaram para trás todos aqueles arroubos da juventude. Teria evoluído ou regredido? Quem a conheceu jovem e a vê agora, espanta-se com a transformação!  Ela queria baile. Queria a noite. Amava o cigarro e a bebida. Nunca dispensou drogas.  Ignorava o perigo. Entregava-se aos prazeres do corpo sem escrúpulos. Amava a Saldanha Marinho, a Cruz Machado e a Tiradentes. Mulher bonita, que te fez o tempo!          Cinquenta anos pesam, moça! O tempo cobra! Impõe marcas acentuadas aos que o menosprezam! Ele não fala nada, observa-te, moça, com piedade como a dizer: você quis, você decidiu! É a vingança silenciosa, indiferente, sem volta!        As Saldanhas Marinhos, as Cruzes Machados e as Tiradentes da vida estão ocupadas por outras que fazem tudo o que você já fez. Que não sabem nada - como você não sabia - da impossibilidade de se corrigir ou de se voltar atrás.           Que conseqüências, moça: artrose, artrite, rugas antecipadas, flacidez, desânimo, cicatri

DESCONHECIDOS

Naquele momento, chovia a cântaros. O dia começava a amanhecer. Uma senhora, apoiada num dos pórticos do cemitério da Água Verde, ouvia histórias que eram contadas por uma pessoa que não conhecia nem nunca havia visto antes.          Numa das capelas mortuárias, velava-se um morador do prédio onde morava. Sem faixas, nem coroas. Conhecia-o de cumprimentos nos corredores ou pelas reuniões do condomínio. Estava ali, mais por causa do social, movida por um sentimento de solidariedade. Havia passado a noite, porque o morto não tinha nem parentes para velá-lo.          Após longas horas de conversas - numa noite chuvosa e gelada que não queria passar - aquela senhora contadora de histórias com quem permaneceu à noite, pareceu-lhe uma velha conhecida.          Uma das histórias enterneceu-a, enquanto, compadecida, observava o defunto cada vez mais pálido, em meio às velas que se consumiam. Nem seu nome sabia. Buscou-o nos imbróglios funerários, sem que aquela descoberta lhe pude

RECEITA

Se um dia tiveres que esquecer,  não siga por caminhos,  ou trilhas, nem por atalhos.  Busque a areia da praia... O mar, feito amigo e cúmplice,  apaga todos os teus rastos!

OBSERVANDO O TRÂNSITO

Estou agora – sete horas e trinta minutos –, indo para o trabalho. Percorro uma daquelas “rápidas” que ligam o centro da cidade. Loucos para chegar no horário, eu e todos aqueles que estão à minha direita, esquerda, atrás e à frente. Quatro pistas de mão única apinhadas.            Faz uma semana que me dei ao capricho de observar o comportamento dos motoristas, naqueles nove quilômetros que me separam dos meus dois locais de paz. E a coisa é curiosa e assustadora: mistura de gente, carros de todos os tipos, caminhões, ônibus, motocicletas, mini-ônibus escolares, bicicletas e até alguns corajosos tentando atravessar a rua a pé. E, nesse entrevero, “bobeou o cachimbo cai”.            Têm os carros femininos, os masculinos, os conduzidos por pessoas mais idosas; aqueles que ao volante trazem jovens motoristas, os cautelosos, “os barbeiros”, os habilitados e os desabilitados. Sem esquecer, é claro, dos que tomaram “umas” durante a noite toda e cedo estão retornando naquele estado

NOSSOS AMIGOS CÃES

A minha amiga Íria é uma pessoa aficionada a cachorros. Mantém um “blog” de resgate canino e também tem suas preocupações com os gatos. Impressionam-me os cuidados que nutre para com esses animais, principalmente aos primeiros.          Mas o que mais me chamou a atenção - visitando a sua página - foi a descoberta que fiz ao conhecer o lado de extrema carência que muitos animais vivem. Abandonados pelas ruas, eles perdem praticamente toda a sua capacidade de sobrevivência. São maltratados, espancados, passam frio e fome, morrem à míngua pelas esquinas na busca de proteção e afetividade. Muitos - atropelados pelo trânsito louco - agonizam pelas calçadas; outros, sem qualquer possibilidade de reação, deixam-se apanhar pelo camburão da morte.          Pois o “blog” da minha amiga Íria faz o trabalho de recuperação desses “bichinhos” - como trato deles quando converso com ela.  Procura arranjar-lhes uma nova casa. Encanto-me com a forma como faz as chamadas. A maneira cuidadosa com

FOGOS CONTRÁRIOS

Naquele dia decidimos que a pescaria seria no Clube do Cascudinho, que fica no rio Ivinhema, afluente do Paraná, em Querência do Norte. Todos estavam necessitando de descanso, após tempos conturbados e difíceis. Foi a equipe de sempre: Diego,   Urtigão,   Dirceu,   Mandinho e eu.          Acontece que recém tinha acabado uma campanha política na cidade, e, na nossa turma, o único vencedor daquela disputa era o Mandinho. Os outros estavam derrotados e mordidos. O nosso candidato levara uma surra memorável, coitado, com uma diferença tão grande de votos que nunca havia acontecido antes. Ninguém imaginou que o nosso companheiro vencedor seria corajoso a tal ponto de enfrentar os quatro, com aqueles apetrechos que preparou para levar junto, às escondidas. A turma dele não perdia uma oportunidade para fazer gozações, humilhando os perdedores, e, ele, era um dos coordenadores na execução daquelas afrontas.         Durante toda a campanha política, os nossos adversários se diferenc

OS AMORES DO CONQUISTADOR

Não demorou muito para que se tornasse o mais procurado de todas. Só as bonitinhas. As feias e velhas ou não lhe interessavam, ou não eram aceitas. Ele parecia ter mel esparramado pelo corpo, porque quem sentava, não desgrudava mais.  Já no segundo mês de emprego, todas as escolhidas estavam sobre o seu controle. As novinhas podiam nem ser muito bonitas, as mais de idade precisavam ter beleza. Bem trabalhadas. Discretas e gostarem de amar. Exigia sigilo total, mas como o ser feminino gosta de vangloriar-se divulgando suas conquistas, não demorou muito para que o pessoal ficasse sabendo. A última a ser informada – como normalmente acontece – foi a sua esposa. Ela passou a receber telefonemas e recebia também mensagens; principalmente de Susi, que – afeita a um sadismo incontrolado – se especializara em descrever os momentos de felicidade que mantinha com o seu esposo. Márcia – a mais traquejada na arte de ser amante – para manterem-se juntos sem qualquer suspeita -, propôs

PROCEDIMENTOS DENTÁRIOS

Tenho sido assíduo frequentador dos consultórios odontológicos. Atividade que pouco fiz na infância, exagero agora. Até hoje, confesso que nunca um dentista deixou de me garantir o trabalho que se propunha a fazer. Sempre me abonou o serviço e eu sempre acreditei nessa eterna conversa fiada. A verdade é que os procedimentos odontológicos resistem uns dois ou três anos e novamente estou eu às voltas com um monte de problemas dentários.          Agora me sugerem -, como panaceia para todos os males -, o implante. Será a solução definitiva, garantem. Meus dilemas bucais estarão resolvidos. Poderei comer maçã inteira, agarrar-me a uma costela a dentes e saboreá-la como sempre sonhei. Em razão disso, estou propenso a realizar essa nova tentativa. Mas, em virtude da minha assiduidade aos consultórios odontológicos, constatei problemas que dificilmente estarão findos um dia. Pergunto: você já viu um sugador, daqueles que te colocam na boca para retirar a saliva quando o dentista trab

ARTIMANHAS

Senta-se no canto daquela sala e curvando-se esconde a face entre as duas mãos feito conchas. Contorce-se formando rugas pelo rosto. Deixa evidente   pelos lábios, os sinais da dor.  - Não está bem? – pergunta sua companheira de trabalho.  - Voltou a enxaqueca – responde suplicando compaixão. Droga... quando ela chega logo cedo, o dia será longo! A outra não responde. Pega o balde, sabão, um pano úmido e parte para realizar suas tarefas. Seria bom que os chefes a vissem ali naquele fingimento – pensa consigo. A gente a fazer tudo direito, não faltar ao serviço, nunca ficar doente e cadê a valorização? Ninguém vê nem observa o trabalho feito todos os dias, enquanto ela passa o tempo daquele jeito, implorando compaixão! Bem que podia chamar a fiscal para que visse aquela cena, mas tem medo que fazendo isso a chefe possa se compadecer e mandá-la embora. Restaria uma tarefa dobrada. Por causa dessas atitudes, suas companheiras de trabalho não acreditavam mais nas palavras de E