FOGOS CONTRÁRIOS
Acontece que recém tinha acabado uma
campanha política na cidade, e, na nossa turma, o único vencedor daquela disputa
era o Mandinho. Os outros estavam derrotados e mordidos. O nosso candidato levara
uma surra memorável, coitado, com uma diferença tão grande de votos que nunca
havia acontecido antes. Ninguém imaginou que o nosso companheiro vencedor seria
corajoso a tal ponto de enfrentar os quatro, com aqueles apetrechos que
preparou para levar junto, às escondidas. A turma dele não perdia uma
oportunidade para fazer gozações, humilhando os perdedores, e, ele, era um dos
coordenadores na execução daquelas afrontas.
Durante toda a campanha política, os
nossos adversários se diferenciaram pelo tipo de rojões que soltavam a
qualquer hora e sem nenhuma economia. Nós odiávamos aqueles procedimentos. Eles
pipocavam nos quatro cantos da cidade e eram de um tipo que tinha três tiros
que explodiam seguidos, depois vinha um quarto que subia riscando o céu e
estourava lá no alto, com um espaço de tempo maior e provocando um barulho que
estremecia o céu. Somente os nossos adversários políticos espocavam aqueles rojões.
Pois naquele dia, quando todas as
tralhas de pesca já estavam no barco e nos preparávamos para deixar o porto, aconteceu
o primeiro incidente. O Mandinho, retirando de uma caixa que ninguém havia
notado, pegou um daqueles foguetes, acendeu-o rapidamente e os três tiros
saíram explodindo no meio do rio, rompendo aquele silêncio. Logo depois o
rojão. Inicialmente, nos espantamos pegos de surpresa, mas depois...
Eu estava ao piloto e meu primeiro
impulso foi retornar ao porto. Após um repentino e geral desconforto, o Daniel
localizou a caixa, que fora recém-aberta, e ainda continha cinco foguetes que
certamente seriam acionados no percurso. Retirou-os daquele invólucro e foi
jogando um a um na água. Estava enfurecido e satisfeito observando aqueles
cartuchos que boiando desciam o rio. Estes não explodem mais, comentou.
O Mandinho, inalterado, em pé, no meio
do barco, ria. Os quatro pareciam perplexos com tal atrevimento, mas acharam
que tudo havia terminado. Ele tivera também o seu castigo, pensavam todos.
Prosseguiram a viagem em silêncio, subindo
o Paranazão, rumo ao Cascudinho, aonde chegaram duas horas depois.
Alimentando conversas chochas entre uma
cerveja e outra, assim permanecemos até quando o nosso adversário político
decidiu aprontar mais uma. Naquele momento, os cinco estavam reunidos na parte
de baixo da construção e já passava das vinte e três horas. O Mandinho ligou um
aparelho de som e colocou uma fita cassete que regulou num som bem alto, para
que escutássemos sem qualquer esforço. Era um discurso do Requião - à época
Governador do Paraná -, que estivera em Querência do Norte num dos nossos
comícios para ajudar o candidato. Nessa fala o governador prometia que se o nosso candidato fosse eleito ele iria construir mil casas populares e doá-las aos necessitados da
cidade. Pois ele havia gravado o discurso e colocava ali para que escutássemos.
Ora..., prometer mil casas populares para
uma cidade como aquela, significava que
seria preciso trazer gente de outros lugares para morar ali e indicava um total
desconhecimento do governador em relação à situação da cidade, que nos deixava
envergonhados. Deduzimos que aquela promessa, em vez de ajudar, havia
prejudicado, tornando-se motivo de gozações de nossos contendores.
Pois o Mandinho repetiu o discurso até
quando lhe foi pedido para que parasse com aquele atrevimento. Aquilo não
passava de uma desfeita dele, achávamos! Ria sem dizer uma palavra, gargalhando
sem controle, com o dedo indicador sobre a tecla que comandava a repetição.
Foi quando parti para o aparelho.
Retirei a fita cassete e a arremessei para o meio do rio Ivinhema.
Não pegamos peixes, e foi a última
pescaria da equipe, que, abatida com os acontecimentos, antecipou o
retorno.
(Capítulo do Livro HISTÓRIAS SOLTAS, páginas 297 a 299)
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