MONOTONIA



Existem pessoas que são loucas e você entende e até aceita que sejam loucas. Vamos mais nos aprofundando e entendendo a "louquice" à medida que passamos a conviver com ela, ou com aquele ou aquela que carrega esses distúrbios.

Pois aqui bem a minha frente -  nessa passarela privilegiada que fica lá embaixo e que há mais de três anos desfruto -  passa constantemente gente com as mais variadas características. Gente bonita, gente feia, crianças, jovens, idosos; a maior parte pessoas normais.
A movimentação nunca para. Às vezes diminui, às vezes aumenta. Sobem ou descem pessoas sozinhas, em grupos, silenciosos, abraçados, correndo, gesticulando, aflitos e desinteressados.
Todos, no meu entendimento, com os seus objetivos. Uns se percebe que passeiam, outros apressados vão caminhando céleres.

Há semanas passando por ali, acabou despertando-me a atenção uma pessoa. Deduzi que este sim estava tomado pela doidice. Dedução precipitada? Não sei, mas fazer o que está fazendo, não é coisa para gente normal. O trajeto das suas evoluções não tem mais que duas quadras.

Conto a história.
Vocês vão ver que não me engano. É uma pessoa de uns quarenta anos. Estatura média e magra. Parece descendente de japonês. Não é possível ver corretamente sua fisionomia porque traz um boné enterrado à cabeça, o que dificulta uma observação mais apurada quando se olha de cima para baixo, como é o meu caso. Veste blusa de uma cor verde ofuscado e agasalho um pouco mais claro, calçando um tênis já bem gasto.
Há mais de trinta dias passa com a mesma roupa e quase sempre no mesmo horário.
Sobe aos pulinhos até a esquina e desce repetindo o mesmo movimento até a outra esquina. Ali para e observa a passagem dos carros. Com segurança recomeça os mesmos pulinhos até a outra esquina. Fico esperando e, não demora muito, lá vem ele retornando. Para novamente como a pedir passagem e segue seu trajeto repetindo os mesmos pulos. Caminha. Pula. Pula e caminha numa constante alternância, fazendo isso tudo bem a minha frente. Atinge a esquina pulando e retorna caminhando. Repete essas movimentações por uns trinta minutos e desaparece.

Deve morar por perto e assim que some acabo esquecendo do maluquinho.
Depois de certo tempo, olho para a passarela e o vejo novamente lá em baixo subindo a rua e dando pulinhos. Repete tudo novamente. Há trinta dias são os mesmos exercícios. Usa a mesma roupa, caminhando umas duas horas por dia.
Não sei seu nome, não sei o que faz, para mim o homem enlouqueceu, vou chamá-lo de “Zé dos Puli-nhos”.

Olha ele! Está lá embaixo. Está passando novamente. Pula, caminha, caminha, pula. Pula caminha, caminha pula.

Deve estar pensando que é um atleta, naquela contaminação cerebral da loucura...

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