A FOTOGRAFIA

Ao entrar em casa, naquela tarde, chamou-lhe atenção a fotografia colocada sobre a cristaleira. Há muito tempo estava ela ali, mas nunca conheceu uma sensação igual a que sentia naquela hora. No silêncio da imagem havia histórias para lembrar.

Naquele final de tarde pareceu ter tempo. Parou. Tomou o quadro nas mãos. Olhou aquela imagem demoradamente e sentiu que havia acontecido grandes transformações. Era um documento familiar.
Lembrou-se da ocasião e do local. Observou-se. Mirou a esposa, o filho e a filha. Calculou: no mínimo vinte e cinco anos atrás! Ele magro, elegante, cheio de vida e forças; ela, posta numa roupa de viagem muito à vontade, exibindo mocidade e beleza. Óculos escuros, pele bronzeada. O menino com os seus dez anos, a menina não chegava a sete.


Passou a recordar do momento e do local. Estavam voltando da praia e o retorno acontecia pela Estrada da Graciosa. Estrada bonita. Cheia de curvas fortes e flores pelas beiradas. Riachos que se precipitavam por entre as pedras formando cachoeiras deslumbrantes.

Todos os anos passavam um período de férias na praia. Moravam no interior e a programação do passeio futuro já acontecia na longa viagem do retorno. Comentavam os momentos alegres e o que deveriam fazer durante a próxima estada no litoral. Debatiam a fórmula para economizar dinheiro durante o ano, a fim de continuar aproveitando daqueles momentos de lazer que julgavam tão necessários e importantes.

- Veja isto Rita! – comentou ele, chamando pela esposa, que no cômodo dos fundos da casa fazia suas pinturas.
- Isto o quê? – murmurou ela, parecendo desinteressada.
- Esta fotografia, veja o Henrique, que rechonchudo; a Luana, tão magrinha!
- Foi tomado de saudosismo! – comentou ela, prosseguindo suas pinturas.
- Olha você! – exibindo o quadro para a esposa.
- Sossega! Não posso parar se não a tinta seca – pedia ela enquanto manuseava o pincel.
- Quanto tempo faz? Como estarão eles?
- Você sabe que estão bem! Ontem mesmo a Luana ligou. É doutora. O Henrique, ah, o Henrique tão diferente ele, vive a sua vida sossegada. Adora passeios. Já conheceu quase toda a Europa! Vive até melhor que a irmã!

Observou novamente aquela cena e pensou: “como a casa ficara grande! Cabia num quadro, num mero papel de fotografia quase esquecido no canto de um móvel.” Poderiam até ir atrás de um lugar menor para morar.

Arrumaria um jeito para resolver aquela situação saudosista pensou ele, sem contar nada à esposa. Que ficasse ela cuidado das suas pinturas!

O tempo foi passando e aquele quadro, posto no mesmo lugar começou a ser visto de uma forma diferente. Observava-o quando saía logo cedo e sempre na chegada. Estava certo de que o tempo havia passado.

Foi quando, um dia, percebeu que aquela cena poderia ser recuperada. Os quatro estavam novamente reunidos. Sabia que o local da fotografia continuava lá. Havia passado algumas vezes pelo lugar e poucas mudanças tinham acontecido na curva daquela estrada. A cascata, no fundo, com um volume menor de água, permanecia despejando suas energias pedreira abaixo. Era o momento, pensou.

- Vamos, falou ele convidando esposa e filhos!
- Vamos – falaram os três.

O fotógrafo foi outro. Nem genro, nem nora poderiam fazer parte daquela recordação. A máquina moderna mostrou-se cruel! Registrou os detalhes do tempo. As antigas crianças, exuberantes na flor da vida; eles, levando consigo os resultados dos longos anos. Não mostravam mais as poses antigas, nem o vigor presente na primeira fotografia.

Quando retorna, à tarde, observa sempre os dois quadros. Um ao lado do outro. Os personagens ocupam as mesmas posições antigas. O local é o mesmo.

Está evidente a evolução do tempo.

Comentários

Anônimo disse…
Pois é... pela lembrança a gente recupera um pouco do tempo que ficou congelado na fotografia. Abraços, Fausto
Anônimo disse…
O verao esta chegando... estamos todos mais proximos... vamos la?
bjs Fe
Este comentário foi removido pelo autor.
AH Mario, mas o tempo nos dá sabedoria, espiritualidade, coisas que qdo muito jovens, não temos, eu falo pro Sergio q devíamos parar de envelhecer nos 40 anos, estamos ainda elegantes, cheios de sabedoria e com energia! minha mãe tem 61 anos, dá dez a zero em mim, em energia, garra, disposição, mas to bem pros meus trinta e poucos anos, tomo minhas vitaminas, tento nao ser taoooo ansiosa.
Agora, outra dica, leve sua esposa, apenas vcs dois, para passearem pela graciosa, depois, deem um pulo em Antonina, passem a tarde num daqueles restaurantes caseiros e tirem fotos no fim da tarde, botem lá do lado das outras e verão q ainda estão lindos, elegantes e renovados, cheios de esperança e amor, amor em todos os sentidos, isso rejuvenesce!!!
adoro qdo vc escreve sobre a vida!!vc arrasa!!!!abçoo, o livro q vc me deu é uma delícia de ler!!!bjooo
Gracinha disse…
Puxa tio,que bonito! Não foi a toa que tive a idéia de escrever um conto em homenagem a vocês, se todas as famílias do mundo tivessem essa consciência de como é importante relembrar seus bons momentos juntos, e ter o desejo de reviver quando possível, o mundo com certeza seria muito mais azul do que as fotos da Nasa dizem que é. Um beijo da sua sobrinha e fã nº 1!

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