TEM ONÇA DO LADO DE CÁ



Pois o Fermino me contou uma história que teimou em afirmar ser verdadeira. Disse que tá cheio de onça lá pelas bandas da Fazenda 29. Lá pelas barrancas do Rio Paraná. Do lado de cá. Do lado do Paraná.

Contam os sem-terras, que as “bichonas” são grandes, do tamanho de um terneiro que já deixou de mamar. Os sinais das patas estão por todos os lugares.

Custei a crer na história, mas depois que me explicou com aquele cuidado e paciência que só ele tem quando conta suas histórias, passei a acreditar.

Mas como está aparecendo onça do lado de cá? Insisti e ele começou. Foi assim. Mais uma daquelas patacoadas do governo. O governo federal inventou de criar uma área de proteção ambiental do lado de lá do Paranazão. Desapropriou um pedaço enorme de terras. Muitas e muitas propriedades todas juntas e fez da famosa Fazenda Peroba - na beira do Ivinhema - o quartel general da fiscalização. Encheu de policiais que não deixam mais ninguém pescar nem caçar lá por aquelas bandas. Tá cheio de barco andando pelo rio com guardas fiscalizando tudo. Até o Clube do Cascudinho indenizaram e desmancharam. Morada só pra bicho, dizem eles.  

Pois para essa área enorme trouxe a bicharada que recolheu pouco antes de formar a represa de Ilha Solteira - aquela que inundou terras e mais terras entre os estados de Mato Grosso do Sul e São Paulo - rio Paraná acima. Veio uma montoeira de animais: cobras, onças, jaguatiricas, veados, cervos, macacos, bugios, capivaras, antas, catetos, porcos do mato, caititus, etc., etc. Toda essa fauna foi despejada naquela enorme área de proteção ambiental e a fiscalização passou a cuidar dela.

Perguntou-me se eu me lembrava dos bandos de macacos que existiam nas ilhas do rio Paraná. Da quantidade de capivaras que povoavam as águas e as barrancas daquele rio. Disse-lhe que me lembrava sim. Comentei até da barulheira que os bugios faziam no amanhecer e ao anoitecer, quando acordavam ou se preparavam para dormir.

Pois é, compadre, não tem mais macaco nem capivara. Sumiu tudo – falou-me ele. As onças foram comendo um por um. Só alguns macacos que não tiveram coragem de descer das árvores continuam vivos. Encontrar uma capivara, só por milagre.

Quando a comida começou a faltar na reserva, elas foram vindo atrás de alimento. Entraram nas ilhas e fizeram a limpeza. Agora já estão atravessando o canalão do rio Paraná. Já estão do lado de cá. Como aqui não tem nem macaco, nem capivara, as comidas serão os terneiros dos sem-terras.

Mas eles já avisaram que a coisa não vai ser bem assim. Que se preparem as onças. O chumbo vai comer. Nada será entregue de mão beijada. E dão a receita: espingarda do cano grosso, baletão mesmo, porque chumbinho fino, daqueles de caçar pombas, não mata onça.

Não sabe -, é o tal do desequilíbrio ambiental, compadre!

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