ADAMASTOR VAI MATAR

Quando Adamastor decidiu pela vingança,
parou para pensar como faria,
andou pela casa meio sem destino,
desceu os degraus da velha e conhecida escada,
que o levaram ao corredor dos fundos.

Aquietou-se a pensar, à entrada do paiol.
Abriu a pesada porta que rangeu.
Abraçou o amplo vazio com olhar amargo.

Lá dentro, utensílios enferrujados,
a desafiar o tempo:
machados, foices, gadanhas, facões,
uma velha machadinha...
seria este o instrumento,
pois nem revólver tinha!

Mas ao seu lado, uma mão invisível,
ofereceu-lhe uma cartucheira reluzente.
Descanhotou-a, cartuchos novos,
postos nos dois canos.
Era só armar e disparar os gatilhos.

Estremecimentos tomaram-lhe por inteiro,
quando a observou com carinho.
Aquilo seria o instrumento!
Uma boa escolha, concluiu!
Adamastor, gigante de ódio, nada via!

O tempo tinha passado tão ligeiro!
Os sonhos desfeitos, sem terem voado.
Tantos propósitos,
projetos que ficaram soltos no caminho,
aspirações frustradas,
estradas traçadas e não percorridas,
o beijo que ficou no sonho,
ou morreu no desejo,

o abraço não concretizado,
a casa destruída,
o amor desfeito,
tudo perdido!
Nenhum projeto à vista
o carinho transformado em ódio,
os livros esparramados pelo vento,
até despido do sentimento narcisista...

Não, não merecia aquela vida,
melhor mesmo a morte,
talvez pudesse recomeçar,
talvez tivesse sorte!

Mirrou aquele instrumento reluzente,
imaginou o seu veneno penetrando a carne,
faltou-lhe a derradeira coragem
seu corpo não era o lugar
onde pudesse abrigar aqueles mensageiros vis!


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